Eu juro, por Apolo, médico, por Esculápio, Higéia e Panacéia, e tomo por testemunhas todos os deuses e todas as deusas, cumprir, segundo meu poder e minha razão, a promessa que se segue:... (ínicio do Juramento de Hipocrates)
Da Justiça para a Saúde, este blog arrisca-se a tornar-se outro muro de lamentações e contra-resposta,por isso há que dar a volta e contar uma história bem mais agradavel e curiosa com o seu quê de lição e tomada de posição própria, como não podia deixar de ser...
Fui operado a um lipoma na testa. Nada de especial, uma pequena cirurgia plástica com a sua razoável mas não intensa "convalescença", mas que como todas as operações nos deixa assim entre o esquisito, o piegas e o verdadeiramente abalado. Cheguei ao hospital meia hora antes da hora marcada (15.00)e entrei por volta das 15.30. Estava ao telefone com o nosso manager e fui salvo pelo gongo clínico. Designaram-me um pequeno cacifo e vesti-me com aquela roupa meio descartável dos hospitais. Compreendo e aceito sem espinhas os motivos higénicos desta farpela mas sem deixar de assinalar claro a total perda de personalidade que aquela toucazinha, o riscado do casaco apijamado e o chinelo que rompe à primeira unhada, trazem consigo. Brincos e anéis fora claro.
Mas, nada de grave, tal como o que ali me levava. Passemos aos timings:
- última refeição: 12.30
- entrada na secretaria da cirurgia ambulatória: 14.30
- entrada na ante-sala da cirurgia ambulatória: 15.30
- hora de operação: apx 18.30
- tempo de operação: apx 15-20 minutos
Sem quiexume algum porque sei que o Português tem a tendência para o hipocondriaco e para o protesto de bolso (por tudo e por nada) até porque duas destas horas de espera são perfeitamente justificáveis até pela ordem e quantidade de cirurgias que se têm de fazer nas duas ou três salas disponíveis. As duas outras horas não têm assim muita explicação e contribuem para o desespero ligeiro, para a fome que começa a apertar e, por vezes, as deambulações do pessoal auxiliar e dos enfermeiros traçam órbitas que nos testam a paciência e nos colocam questões sem final feliz.
Esta espera desespera foi tornada terrível porque o inevitável senhor mais velho,passada a primeira meia hora de espera,repetiu a cada cinco minutos que se ia embora, que não se admitia, que as enfermeiras (ele não lhe chamou as enfermeiras)não trabalhavam, rematando com perguntas directas (a mim que tentava não ouvir) se eu era calmo, concluindo com um seminal "o amigo disse que era uma pessoa calma, não foi?"- "foi..." " o amigo não é calmo, o amigo é um santo!" desculpe... com certeza não foi um elogio...Relatou-me todas as suas operações, quistos, rim, dores. Protestou. Andou de um lado para o outro.Passou à minha frente no fim. A ordem é de chegada. Quem não chora...mas não me importei, deveras.
Depois lá fui para dentro não sem antes ouvir um ringtone da Luna e ver que nas poucas revistas na rack se encontrava o nºda Visão que nos acompanhou a Belgrado, aquando da gravação dos videos da Scoprion e da Night Eternal. Estaria a alucinar? Seria da fome?
Entrei na sala, um bocado abalado da espera e de todo aquele aparato, Fiz-me á cama, levei a pica na testa e lá fui eu mesmo sem a reacção nervosa, ao cuidado da anestesia, pareceu-me tudo uma lobotomia, o penso na cabeça, a abertura para o alvo/lipoma à lâmina do bisturi, a sensação do corte, da excisão, do mexerem-me quase dentro da cabeça. Enfim, não foi agradável, sem ser doloroso, e sei que estou a ser piegas mas em nome da verdade. Senti-me mal, quebra de tensão-provavelmente-, levei logo a boca da enfermeira de serviço de que os homens são sempre muito mais susceptíveis que as mulheres "a estas coisas" (para quando o fim destas comparações? para mim são, foram e sempre serão o sexo forte)ok, manobra de munique (pelo menos o que ouvi)efectuada, cabeça para baixo, mais irrigação e lá continuei acordado durante aqueles longos minutos. O cirurgião puxa conversa: o que faz, ai é músico, o que toca e voilá chegamos aos Moonspell! O enfermeiro que assiste: o quê é o Fernando Ribeiro? E assim nos conhecemos numa mesa de operações.
A vida dá estas voltas invulgares mas recupero a minha identidade depois de um santal de pêra e dois pacotes de bolacha Maria dando uns autografos ao Emanuel (se a memória não me falha). Quando lá voltar para o resultado anatómico do corno (como já toda gente carinhosamente o tratava)a ver se não me esqueço do poster autografado!
8 comentários:
Dando continuidade á tradição do "meu caso é pior que o teu..." tambem fui operada (na vespera de Natal, haja protagonismo, caramba!! :) a uma cena um pouco mais complicada mas com peripecias que nao lembram a ninguem... Algo do genero : sintomas que faziam prever um apendice cansado de existir, mas que se revelaram mais graves que o suposto e 9,20h de espera na urgencia do Amadora Sintra. As 9 horas ainda vá, o que chateou mesmo foram os 20 minutos... Adiante :) Quando se tornou humanamente impossivel esperar mais, saí do hospital publico (sem ser atendida) e rumei a um hospital privado (vao-se os aneis ficam os dedos...). Atendimento ao melhor nível, ou antes, ao nível do que a gravidade da situação impunha, cirurgia demorada, recuperação dolorosa e demorada, mas eis que as coisas de começaram a recompor e "ala" para casa... Afinal, não ha nada como a nossa casinha :)
O melhor estava reservado para o final. Eis-me chegada a casa, ainda no atrio do predio, abrindo a caixa de correio, que "deitava por fora" de tantas missivas acumuladas. Mas uma saltou á vista : uma nota de debito do Hospital publico para ir sem demora pagar um episodio de urgencia a que tinha recorrido mas do qual saí sem pagar (qual caloteira, fugindo á sucapa para não pagar)... No meio de tanta dor, ainda houve espaço para umas boas gargalhadas!!! :)
P.S.-respondi ao dito hospital por carta registada, dando conta que fazia ideias de manter o meu "estatuto" de caloteira. Até agora ninguem me respondeu...
Ave, spectatore!
Gostaria de comentar os teus últimos dois artigos em jeito de remissão; segue-se um momento televisivo de rara lucidez:
Todos os pássaros comem trigo e quem paga é o pardal. E o mexilhão também...
VR.
Como já tinha dito anteriormente, o Fernando não imagina o quanto é bom, não só para os fãns da banda mas também para os fãns do Fernando como escritor, pessoa que é o meu caso que o admiro muito, o bom que é, quando o Fernando partilha com os seus fãns como o faz.
Desde já desejo lhe as melhoras e espero que tudo continue a correr bem, muito obrigada por o ter partilhado.
As melhoras
Raquel Valente
Olá :)
Deves ter passado por um mau bocado, mas no meio disto tudo, conheceste um fã, já viste? ;) Só de pensar que faço uma tempestade quando vou ao dentista, com a agulha da anestesia... Espero que estejas a recuperar bem. Beijinhos
Xifu
Eu tenho a experiência oposta, do outro lado da mesa de operações ou, pelo menos, lá por perto.
Ainda assim não consigo compreender alguns aspectos da (falta de) saúde em Portugal, as esperas, o mau atendimento.
Apesar de saber que não é fácil, "do outro lado".
Não se pode agradar a Gregos e Troianos e, por vezes, os conflitos não são fáceis de gerir.
Por vezes falta um pouco mais de capacidade de falar com os utentes, de se relacionar ainda que apenas por umas horas . Mas mantenho esperança que ainda vai haver uma mudança para melhor!
Espero que a recuperação tenha sido boa.
Rita
Este post chamou-me particularmente a atenção. São incontáveis os problemas da nossa "saúde", isto tanto para o utilizador como para os profissionais. A minha perspectiva desse lado (o de profissional) ainda não começou sequer e aí retorno ao desespero que é perseguir um emprego na minha área específica. Uma profissão que muitos tornam por nobre e outros tantos renegam para uma imagem de subserviência. Nada mais errado, mas ainda existem pessoas que tentam mudar esta imagem!!
Com os melhores cumprimentos
Joana
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